
Apesar da forte campanha para levar o Brasil de volta ao Oscar de melhor filme internacional, “O Agente Secreto“, de Kleber Mendonça Filho, pode ter pela frente o mesmo concorrente que já o ofuscou em Cannes: Jafar Panahi.
O premiado cineasta iraniano retorna à disputa com “Foi Apenas um Acidente“, longa que venceu a Palma de Ouro no Festival de Cannes e agora representa a França na corrida pela estatueta. O filme é um dos principais destaques da 49ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, onde Panahi é um dos convidados e virá pessoalmente apresentar a obra.
Fiel ao estilo do diretor, “Foi Apenas um Acidente” é um drama contido, que extrai força política e tensão com economia de meios, sem recorrer a grandes reviravoltas. O filme parte de um episódio aparentemente banal: o barulho da prótese de um cliente em uma oficina mecânica desperta no protagonista — um ex-preso político — a lembrança do som feito por seu torturador. A dúvida sobre a identidade do homem desencadeia uma busca silenciosa e angustiante por outros sobreviventes que possam confirmar se o antigo algoz está ali, diante deles. Vingança ou engano? Essa incerteza é mantida até o fim, tanto para os personagens quanto para o espectador.

A obra, como outras de Panahi, mistura drama pessoal com crítica política. O cineasta, frequentemente perseguido pelo regime iraniano, já foi preso e impedido de sair do país por acusações de produzir propaganda contrária ao governo.
Ao receber a Palma de Ouro, Panahi fez um discurso incisivo: “O mais importante agora é a liberdade do nosso país. Chegou o momento de unir forças. O cinema é uma sociedade. Ninguém tem o direito de nos dizer o que filmar.”
Com essa vitória, ele completa a tríplice coroa dos maiores festivais europeus: já havia ganhado o Urso de Ouro em Berlim, por “Táxi Teerã“, e o Leão de Ouro em Veneza, por “O Círculo“.