
No próximo domingo, 2 de março, o mundo voltará seus olhos para a cerimônia do Oscar, a maior premiação do cinema. Estaremos torcendo, no melhor estilo Copa do Mundo, para que Fernanda Torres e Ainda Estou Aqui (2024) conquistem os prêmios em que estão concorrendo: Melhor Atriz, Melhor Filme Internacional e Melhor Filme.
Além do brilho dos tapetes vermelhos e das estatuetas douradas, a data nos convida a refletir sobre um aspecto essencial da sétima arte: seu papel como espelho da sociedade. O cinema é mais do que simples entretenimento; ele reflete nossos valores, angústias, sonhos e transformações sociais. E é sobre isso que quero falar neste espaço hoje.
Há muito tempo, o cinema tem sido uma ferramenta poderosa para capturar o espírito do tempo. Filósofos como Walter Benjamin (1936) destacaram como a arte cinematográfica democratizou a experiência estética, permitindo que as massas acessassem representações simbólicas de suas próprias vidas. Filmes como Tempos Modernos (1936), de Charlie Chaplin, refletiam a mecanização e a alienação do trabalhador na era industrial. Quase um século depois, essa máxima continuava válida com, por exemplo, Clube da Luta (1999), de David Fincher, que capturou o desencanto da sociedade contemporânea com o consumismo e a masculinidade tóxica.

Cada década projeta no cinema seus dilemas e esperanças. Nos anos 1950, o pós-guerra trouxe o filme noir, repleto de pessimismo e desconfiança. Os anos 1970 refletiram um Estados Unidos cínico e desconfiado após o escândalo Watergate, com filmes como Todos os Homens do Presidente (1976). Nos anos 2000, o cinema reagiu ao trauma do 11 de setembro com narrativas que exploravam o medo e a segurança, como Guerra ao Terror (2008).
Além de representar sociedades inteiras, o cinema também age como espelho individual. Cada espectador encontra nos personagens traços de sua própria experiência. Carl Jung (1951) desenvolveu a ideia de arquétipos, padrões universais da psique humana. O herói, o mentor, o vilão e a jornada de autodescoberta aparecem de O Mágico de Oz (1939) a Interestelar (2014), evidenciando como buscamos significados profundos na ficção.
As representações também são ferramentas de inclusão. Durante décadas, Hollywood negligenciou vozes marginalizadas, mas avanços recentes trazem histórias mais diversas e autênticas. Moonlight (2016) trouxe uma perspectiva sensível sobre identidade e sexualidade, enquanto Pantera Negra (2018) celebrou a cultura negra em um blockbuster de super-heróis. Ainda é pouco, mas é um caminho em construção.
Curiosamente, o cinema não apenas reflete nossa realidade, mas também a antecipa. O gênero da ficção científica é um exemplo disso. Filmes como Blade Runner (1982) especularam sobre o impacto da inteligência artificial, enquanto Matrix (1999) previu debates sobre realidade virtual e controle tecnológico. Steven Spielberg, em Minority Report (2002), mostrou interfaces digitais que anos depois inspirariam tecnologias reais. O cinema não apenas observa a sociedade, mas a molda.
Enfim, caro leitor, quando os vencedores do Oscar forem anunciados, além de celebrar a arte cinematográfica, vale refletir sobre o que esses filmes dizem sobre nós. Que histórias estão sendo contadas? Que medos e esperanças estão sendo projetados na tela? O cinema é um espelho poderoso e, ao olharmos para ele, podemos ver um pouco mais de nós mesmos.