
Antes de entrar no tema propriamente dito, gostaria de contar um relato pessoal: sempre fui uma criança tímida por natureza, nunca gostei muito de socializar, sempre tive pânico de falar em publico, me relacionar, enfim… em 2005 entrei para o teatro na escola e consegui experimentar a sensação de viver personagens, vestir-me de arquétipos diferentes do meu. O palco tem uma magia e quem experienciou sabe o quão libertador pode ser. Isso me transformou e modulou um pouco a maneira de me expressar através da arte.
“Alter ego (do latim alter: outro; ego: ‘eu’) é uma locução substantiva latina, cujo significado literal é ‘outro eu’”. Nessa definição eu escolheria um personagem que eu me projetaria, essa persona seria Cássia Eller.
Cássia era uma mulher que fora dos palcos era extremamente tímida, reservada, segundo palavras dela mesma: “A música pra mim foi uma fuga da minha incapacidade de conviver socialmente com as pessoas, de partilhar, de compartilhar de uma situação assim… de uma conversa, de uma festa, da minha timidez, foi uma fuga da minha timidez. (Porque) eu tenho medo das pessoas, eu tenho medo de gente, só com as pessoas que eu tenho muita intimidade que que eu consigo me abrir mais, ser mais sincera, vamos dizer assim, aí fora disso eu só tenho medo”.

O paradoxo disso é, que em cima dos palcos, Cássia virava um monstro, era verve, era drive, era rock’n’roll, em essência. Fora deles, a voz era tímida e mansa, quase como alguém que gostaria de não estar ali. Acho que todo artista meio que sofre um pouco dessa síndrome e usa a arte como esse escudo. Cássia era, pra mim, a síntese disso.
O teatro, particularmente, me ensinou que nós vestimos máscaras sociais, assumimos personagens diariamente para lidarmos com nossas relações interpessoais, de tal maneira nos apropriamos de arquétipos para nos conectarmos com os semelhantes. A arte faz essa ponte.
Eu tive um baque grande quando Cássia Eller partiu. Pra mim, foi como se uma amiga ou um pedaço de mim fosse junto, uma das artistas que mais me influenciaram pelo jeito de ser e usar a arte para agregar pessoas e assumir seu outro ego. E não há nenhuma outra hipótese que eu não considere, mas o que eu queria mesmo ser é a Cássia Eller.