Amores Materialistas: Celine Song aposta no cinismo para estudar a mercantilização do romance

Diretora questiona como o amor se transformou em um produto negociável
Dakota Johnson está em casa no papel, com sua persona naturalmente irônica — familiar ao público por suas entrevistas descontraídas / Foto: Divulgação

Em Vidas Passadas (2023), Celine Song explorou os caminhos opostos trilhados por seus personagens: de um lado, o reencontro com as raízes coreanas por meio do antigo amor Hae Sung; do outro, a entrega a um estilo de vida moderno e americano. O longa constrói um retrato intimista sobre identidade, pertencimento e os dilemas do amor, combinando romance e nuances de uma história de amadurecimento.

Já em Amores Materialistas, Song mergulha no cinismo dos tempos digitais, com aplicativos como Tinder e Bumble, e sob o peso do capitalismo tardio, para questionar como o amor se transformou em um produto negociável.

A história acompanha Lucy (Dakota Johnson), uma casamenteira envolvida em um triângulo amoroso. Ainda apaixonada por John (Chris Evans), um garçom e aspirante a ator, ela inicia um relacionamento com Harry (Pedro Pascal), um homem rico e irmão do noivo de um casal que ela ajudou a unir. Harry é o parceiro ideal sob todos os critérios racionais, mas o reencontro com John bagunça tudo novamente.

Consequentemente, Song volta a trabalhar com contrastes: o roteiro transforma o amor em um verdadeiro mercado, no qual atributos pessoais são avaliados como se fossem metros quadrados, e cada escolha amorosa é quase uma negociação de custo-benefício. A diretora injeta ironia até nos momentos mais caricatos, como a valorização de um pretendente por ser “quinze centímetros mais alto”.

Nesse cenário, o personagem de Pedro Pascal ganha força como a representação do desejo por estabilidade e status, enquanto o John de Chris Evans encarna o caos apaixonado, mas imprevisível. O triângulo amoroso entre os três move a narrativa com equilíbrio entre afeto e crítica social.

A partir disso, a comédia surge com sutileza, construída no tempo exato de cada cena, sem recorrer ao exagero. A fotografia reforça a dualidade: com Harry, a câmera estática e simétrica reflete o universo sofisticado das mansões e dos restaurantes elegantes; com John, a câmera trêmula e dinâmica transmite a intensidade de uma vida mais desorganizada, porém vibrante.

Em alguns momentos, o filme perde o compasso ao tentar mergulhar em um drama mais denso, o que entra em conflito com o tom irônico que o sustenta. Ainda assim, os acertos são muitos. Song traduz os dilemas afetivos contemporâneos com uma linguagem genuinamente millennial — menos Challengers (2024), como se poderia esperar, e mais próximo do olhar agridoce de Woody Allen.

No fim, Amores Materialistas mostra que não há respostas definitivas no amor. Não existe fórmula certa nem investimento seguro. O sentimento, por si só, carrega contradições, e talvez justamente por isso o caos seja tão fascinante.

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