Urchin: imperfeito, mas tão carismático quanto seu protagonista

A obra, sem data de estreia no Brasil, foi exibida na 49ª Mostra
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O filme marca a estreia de Harris Dickinson na direção / Foto: Divulgação

É inegável que, aos 29 anos, Harris Dickinson se consolida como um dos nomes mais promissores de sua geração. Ainda que sua carreira oscile entre altos e baixos, o ator exibe um carisma raro e uma curiosidade criativa que o colocam entre os talentos mais instigantes do cinema britânico contemporâneo.

Prestes a interpretar John Lennon em um ambicioso projeto sobre os Beatles, Dickinson vem trilhando um caminho autoral: estudou direção, mergulhou no ofício da atuação e agora estreia atrás das câmeras com Urichin, seu primeiro longa como diretor.

O filme tem como protagonista Mike (Frank Dillane), um morador de rua que transita entre a lucidez e o delírio, incapaz de se encaixar em qualquer sistema. Conhecido por interpretar o jovem Voldemort em Harry Potter e o Enigma do Príncipe, Dillane entrega uma atuação visceral, tornando-se o verdadeiro coração da obra.

Em vez de culpar as instituições que o abandonaram, o roteiro, escrito pelo próprio Dickinson, foca nas contradições internas do personagem, um homem que, mesmo diante de oportunidades de recomeço, insiste em se autossabotar.

Com isso em mente, Dickinson filma seus personagens com empatia e desconforto, mostrando um cotidiano de dor e isolamento sem recorrer à piedade. A narrativa flui de forma orgânica, lembrando os primeiros atos de Laranja Mecânica, em que cada novo evento é consequência natural do anterior, conduzindo o espectador a um espiral inevitável de conflitos.

Embora a repetição do plano e contra plano denuncie certa imaturidade formal, a montagem surpreende ao ganhar fôlego em passagens musicais e delírios psicodélicos, revelando um diretor atento à linguagem e à textura da imagem.

O desfecho, no entanto, não mantém o mesmo equilíbrio: ao optar por um clímax operístico, Dickinson sacrifica parte da crítica social e da melancolia que sustentavam o filme, deixando transparecer um toque de vaidade autoral.

Mesmo assim, Urichin é um primeiro passo admirável, corajoso, intenso e visualmente marcante. É o tipo de estreia que anuncia não apenas um novo diretor, mas um artista em busca de sentido em meio ao caos, e que, se continuar nesse caminho, pode se tornar uma das vozes mais autênticas do cinema independente nos próximos anos.

Filme visto na cobertura da 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

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