
Fazia tempo que o cinema brasileiro não atravessava um ano tão luminoso quanto 2025. Logo na virada do calendário, o brilho dourado do Globo de Ouro conquistado por Fernanda Torres, o primeiro da história para uma atriz brasileira, passou a iluminar o caminho das produções nacionais.
A temporada de prêmios avançou com uma sequência de elogios à atriz e ao filme que protagonizou, Ainda Estou Aqui, de Walter Salles. Sucesso simultâneo de crítica e bilheteria, a trajetória culminou no feito histórico do primeiro Oscar do Brasil, na categoria de filme internacional. A consagração pareceu ecoar a frase de Torres que viralizou naquele período: “a vida presta”.
O cenário se tornou ainda mais favorável após a implosão da campanha de Emilia Pérez, até então favorita à estatueta. Envolvido em polêmicas e alvo de críticas de brasileiros nas redes, o musical francês perdeu força, abrindo espaço para a arrancada definitiva de Ainda Estou Aqui. Fernanda Torres virou figura onipresente na imprensa americana e nas redes sociais da Academia de Hollywood.

Nem isso, porém, foi suficiente para levá-la ao Oscar de melhor atriz, prêmio que acabou nas mãos da jovem Mikey Madison, por Anora, numa cerimônia que consagrou o filme. A derrota de Demi Moore, até então favorita por A Substância, acabou sendo lida como uma confirmação do diagnóstico que o próprio longa faz sobre o etarismo em Hollywood.
Durante toda a temporada, o Brasil viveu um clima de Copa do Mundo. Em pleno Carnaval, foliões foram às ruas com máscaras de Fernanda Torres, enquanto o país se reunia diante da televisão para assistir Walter Salles subir ao palco do Dolby Theatre e erguer o Oscar tão aguardado pelo cinema nacional.
Confetes e serpentinas verde-amarelos seguiram colorindo o primeiro semestre. E o orgulho não veio apenas de Ainda Estou Aqui. Antes do Oscar, O Último Azul, de Gabriel Mascaro, havia conquistado o Urso de Prata em Berlim. Depois, O Agente Secreto, de Kleber Mendonça Filho, protagonizou uma campanha histórica no Festival de Cannes.
O thriller político saiu da Riviera Francesa com dois prêmios importantes: melhor ator, para Wagner Moura, e melhor direção, para Mendonça Filho. O desempenho abriu caminho para o que promete ser mais uma temporada intensa para o Brasil em Hollywood.
Pré-selecionado para o Oscar de filme internacional e indicado ao Globo de Ouro nas categorias de melhor filme de drama, filme em língua estrangeira e ator em drama, O Agente Secreto desponta como forte candidato a repetir a trajetória de Ainda Estou Aqui e alcançar mais de uma categoria no Oscar.
Mas o vigor do cinema brasileiro em 2025 não se resumiu às premiações. Nos últimos meses, a produção nacional demonstrou mais consistência do que a própria safra hollywoodiana, com títulos elogiados como Homem com H, Manas, Oeste Outra Vez, O Filho de Mil Homens, Apocalipse nos Trópicos e Os Enforcados.
As bilheterias, contudo, seguem pressionadas – um problema global. Entre as exceções, destacam-se Pecadores, que triunfou com uma história original em meio ao domínio de sequências, e Zootopia 2, já no fim do ano. Quem deixou escapar uma chance comercial foi a Netflix, dona de um dos maiores fenômenos de 2025, a animação Guerreiras do K-Pop, lançada diretamente no streaming. O sucesso foi tamanho que o filme acabou chegando às salas depois, em um movimento raro.
Ainda assim, a maioria das produções continua enfrentando salas vazias, cenário que pode se agravar com o anúncio de que a Netflix pretende comprar a Warner Bros. e a HBO Max, entrando de vez no mercado tradicional de cinema. O temor da indústria está no histórico da plataforma, pouco comprometida com a exibição em salas e defensora da ideia de que o conteúdo deve chegar ao público onde ele estiver.
A notícia sintetiza um ano turbulento para a cinefilia americana, agravado por ataques do presidente Donald Trump ao setor cultural. Logo no início de 2025, o republicano ameaçou taxar filmes e séries não filmados em solo americano, numa reação à fuga de produções do país. Com os custos elevados de filmagem, especialmente em Los Angeles, estúdios têm buscado alternativas no exterior. O protecionismo prometido por Trump foi visto como contraproducente pela própria indústria e, até agora, ficou restrito às postagens na Truth Social.
Ainda assim, os efeitos políticos foram sentidos. Estúdios passaram a evitar confrontos diretos com o presidente, de quem dependem em negociações internacionais e na aprovação de grandes fusões, como a da Paramount com a Skydance, concluída em agosto com aval da Casa Branca. Em paralelo, a Paramount e outros estúdios silenciaram produções críticas, enquanto filmes como Wicked: Parte 2, Quarteto Fantástico: Primeiros Passos e Elio evitaram temas sensíveis para não afastar o público conservador.
As exceções ficaram por conta de obras mais incisivas, como Uma Batalha Após a Outra, Eddington e Bugonia. O desconforto político, aliás, se fez sentir de forma ainda mais explícita no Festival de Cannes, marcado por filmes sobre a guerra em Gaza e o avanço do autoritarismo, como Foi Apenas um Acidente, vencedor da Palma de Ouro, além de manifestações públicas de artistas como Robert De Niro e Wes Anderson contra Trump.
Em meio à tensão, a equipe de O Agente Secreto cruzou a Croisette ao som do frevo pernambucano. Se as indicações ao Oscar se confirmarem em janeiro, tudo indica que o Brasil poderá começar o próximo ano em clima de festa outra vez.













