De IA e louco todo mundo tem um pouco

Texto de Lucas Paiva, Mestre em Comunicação e jornalista com experiência em metodologia de pesquisa
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Será que estamos preparados para a epidemia de falta de profundidade ou da pseudoprofundidade dos novos especialistas, dos gurus e dos profetas do fim do mundo? / Foto: Divulgação

Essa reflexão começou quando li o texto, enviado pela minha esposa, sobre como as empresas estão utilizando “detectores” — e aqui me resguardo ao direito de usar aspas e travessão sem ser confundido com IA — de inteligência artificial nos textos escritos pelos colaboradores de sua empresa. Foi aí que eu pensei: O que fazer então, se o texto que escrevi for erroneamente assumido como “escrito por IA”. Minha imaginação prega peças, mas em cenários distorcidos e contorcidos sou uma espécie de rei sem reino.

Vejamos os cenários que criei:

  1. O primeiro, e mais irascível, é aquele em que xingo a tudo e todos, ressaltando que é uma falta de respeito falar que meu texto tem traços de IA. Esse é o cenário que mais me agrada, mas é efêmero. Há aqui um pico de adrenalina, uns dedos em riste, um isso e aquilo, mas ele passa e a ressaca que chega é terrível. 
  2. O segundo é o intermediário: aceito que escrevi mais ou menos com IA. É o texto meia-bomba, ele é meio formal e meio despreocupado. Está na linha tênue do perigo, sempre falando “Ó se eu quisesse” de frente para a janela do CHAT GPT ou similares. Não recomendo esse, pois aqui não falamos de ressaca, mas sim de aceitação e tapinhas nas costas. “Pois é, ele até tem potencial, não é? Mas fica usando esse chat aí. Uma pena.” A vergonha moral é maior do que a ressaca.
  3. O terceiro, amigos, é a anarquia. Aqui já não existem leis, não existe mais a moral e bons costumes, tudo é cuscuz paulista. Deu o branco numa legenda? Chat GPT. Não consegue escrever a primeira linha de algo? Não há problemas, ele escreve o texto todo para você. E lá se vai aquele operário da estatística magicamente, ou assim que pensamos, escrevendo laudas e laudas de texto com um pressionar de botão. É tentador, mas a que custo? Esse desbunde é o pacto de Sísifo freemium, assinatura de uma perdição.

Vejam, nem ressaltei aqui o glossário que nasce desse uso desenfreado. Muitas pessoas já se pegam falando prompt, algoritmo, calculadora de palavras, ou então colocam nomes amorosos a algo imaginário, como Gepeto, chatinho, ou somente o amigo lá. Deixarei essas elucubrações para uma próxima missiva, afinal, não há linhas de comando para conter a frustração. 

Enfim, esses foram os cenários que pensei e que não nos edificam, mas também não nos destroem. Porém, o que podemos perceber, sem sombra de dúvidas, é que vivemos um delírio, e esse nem é febril, é aquele gelado igual uma comida que é gostosa na hora, mas que finaliza seu estômago horas depois. Será que estamos preparados para a epidemia de falta de profundidade ou da pseudoprofundidade dos novos especialistas, dos gurus e dos profetas do fim do mundo? Não é possível responder, mas como diria o saudoso Luis Fernando Veríssimo, teremos ao menos uma história para contar, e, se tivermos sorte, ela ainda pode ser engraçada.

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