Em O Último Azul, Gabriel Mascaro tece críticas ao modo de vida capitalista em uma viagem de autodescoberta

O filme tem estreia marcada para a próxima quinta-feira, 28, em todo o Brasil
Momento da intensa participação de Rodrigo Santoro no primeiro ato do filme / Foto: Divulgação

Gabriel Mascaro já demonstrou familiaridade com universos distópicos e com a ficção científica. Em seu filme anterior, Divino Amor, o pernambucano lançou um olhar ácido sobre o neopentecostalismo, em uma obra que, em linhas gerais, pode ser vista como uma espécie de versão brasileira de Black Mirror. Agora, em Último Azul, escrito em parceria com Tibério Azul, ele direciona sua crítica por meio de um retrato íntimo da protagonista.

No longa, ambientado em um Brasil de contornos quase distópicos, o governo impõe a transferência de idosos para uma colônia habitacional obrigatória, onde deveriam “desfrutar” dos anos finais de suas vidas. Entre eles está Tereza, uma mulher de 77 anos que recebe a ordem de exílio compulsório. Antes de se render ao destino imposto, ela decide navegar pelos rios da Amazônia em busca de um último desejo — uma travessia capaz de transformar para sempre o rumo de sua história.

Na ocasião, Denise Weinberg dá vida a Tereza, personagem multifacetada que busca, ao mesmo tempo, escapar da sociedade que deseja aprisioná-la e descobrir quem realmente é fora da linha de produção à qual esteve submetida durante toda a vida.

Em uma clara crítica a uma sociedade etarista, que valoriza apenas a força de trabalho, Tereza já não encontra espaço, por não possuir mais a “serventia” ou a produtividade esperada de uma mulher na terceira idade. As autoridades invadem sua privacidade para lhe retirar a liberdade, mascarando a opressão sob o discurso de caridade e cuidado.

Até mesmo sua filha a abandona em nome da ordem que pretende enclausurá-la. Nesse cenário em que já não possui lar nem família, a busca por um novo sentido de existência torna-se sua última alternativa enquanto foge. Seu primeiro impulso é perseguir a realização de um antigo sonho: voar.

Mascaro não é sutil ao comunicar o sentimento de prisão que sua protagonista enfrenta. Em determinados momentos, chega a escancarar símbolos que refletem o estado atual de Tereza — o que pode soar redundante ou excessivamente didático.

A grande riqueza do filme, no entanto, está nos personagens: tanto na protagonista quanto nos coadjuvantes que ela encontra ao longo da jornada. O diretor recusa um olhar excessivamente tecnológico sobre essa distopia futurista, criando um “não-lugar” em que as únicas referências concretas são as paisagens amazônicas. Suas vastas florestas e rios, aparentemente intocados, refletem a amplitude subjetiva da personagem — perseguida antes mesmo de se descobrir.

O longa também incorpora elementos místicos, como a presença da lesma de gosma azul. A narrativa ganha força quando Tereza, a princípio, rejeita o convite do personagem de Rodrigo Santoro para adentrar nesse universo de misticidade.

Por fim, ao compreender que sua liberdade só poderia ser alcançada pela subversão da lei e da normalidade, Tereza encontra, enfim, sua tão sonhada emancipação. Ao perceber, à distância, que seu antigo sonho era apenas uma ilusão imposta pela sociedade opressora, ela se liberta para explorar seu eu interior sem o intermédio do opressor.

Acompanhe o Veredas nas redes sociais e fique por dentro de tudo!

ASSUNTOS

Publicidade

Mais lidas

Publicidade