
Depois do desabafo diante do luto pela morte de seu pai, transformado no épico novelesco que é Magnólia, Paul Thomas Anderson decidiu que seu próximo filme teria apenas 90 minutos e seria estrelado por Adam Sandler. O diretor passou, então, a explorar outros territórios: acompanhava a carreira de Sandler, de quem era grande fã — especialmente por seu estilo cômico — chegando até a dirigir curtas para o Saturday Night Live.
No podcast da A24 com os irmãos Benny e Josh Safdie, diretores de Bom Comportamento (2017) e Joias Brutas (2019), Anderson comentou o que mais admira na carreira de Sandler: sua atuação ansiosa e os momentos em que explode em fúria. Embriagado de Amor marcou a primeira performance dramática de Sandler, conquistando a Palma de Ouro em Cannes e rendendo a Anderson o prêmio de Melhor Diretor.
Barry Egan (Adam Sandler) é um pequeno empresário que enfrenta dificuldades financeiras. Criado ao lado de sete irmãs, sua infância foi marcada por abusos, deixando-o inseguro e com medo de amar. Até que surge em sua vida Lena Leonard (Emily Watson), uma mulher misteriosa por quem Barry se apaixona. Para viver esse amor, porém, ele precisará viajar ao Havaí e enfrentar uma quadrilha de mafiosos.

Em entrevista a Marc Maron, quando questionado sobre o filme, Anderson declarou em alto e bom som: “É um filme sobre amor.” Nada poderia resumir melhor o longa. Mais uma vez, o diretor parte de um fato real — a história do engenheiro David Phillips, que explorou uma brecha em uma promoção de alimentos para acumular milhas aéreas — para projetar sentimentos de ansiedade, inadequação, masculinidade e, no fim, o poder transformador do amor.
A escolha de Sandler revelou-se extremamente acertada. Embora frequentemente criticado por suas comédias voltadas ao grande público, sua persona funciona de forma muito mais interessante nas mãos de cineastas que sabem explorá-la. Aqui, ele traduz com perfeição o adulto ansioso dos anos 1990: sua inadequação social e seus surtos de raiva se encaixam como uma luva — brilhante — na história.
Barry expõe a pressão social para que alguém seja extrovertido, carismático, “bom de papo”. Antissocial, ele mal consegue encarar as pessoas nos olhos. Não domina a mise-en-scène: tenta o tempo todo escapar do quadro, sobretudo nos momentos mais constrangedores. Anderson subverte, assim, a imagem tradicional do homem empreendedor — viril, confiante, líder — e revela, em Barry, as marcas de uma vida inteira de abusos.
O diretor constrói essa atmosfera de desconforto por meio de todos os elementos: da trilha sonora dissonante à fotografia estourada e instável. A entrada de Emily Watson traz uma dose de harmonia à vida de Barry, permitindo que ele enfrente o mundo que sempre o oprimiu — de suas irmãs ao vigarista vivido por Philip Seymour Hoffman.
Com o poder do amor em suas mãos, Barry consegue finalmente encarar tudo. Em uma das cenas mais belas do filme, ele domina o quadro ao reencontrar Lena no Havaí. Embriagado de Amor reafirma a habilidade narrativa de Paul Thomas Anderson, que, por meio de uma obra íntima e delicada, transforma um ator subestimado pela crítica em veículo para contar uma história com inventividade e beleza.