Quarteto Fantástico: Marvel vai onde nenhum super-herói jamais esteve

Primeiros Passos é o melhor filme do MCU desde Guardiões da Galáxia Vol. 3
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Com Primeiros Passos, o Quarteto Fantástico finalmente encontra seu caminho em sua quarta tentativa de adaptação para os cinemas / Foto: Marvel Studios

É compreensível o desânimo diante da estreia de mais um filme do Quarteto Fantástico. Nos últimos 30 anos, o grupo passou por diversas tentativas de adaptação para os cinemas — todas frustradas, sem nunca atingir um resultado minimamente convincente. Além dessa espécie de “maldição” que parece acompanhar a equipe, pesa também o fato de que sua entrada no Universo Cinematográfico da Marvel aconteceu tarde demais, em um momento de crise criativa, marcado por produções recentes que têm sido, no melhor dos casos, esquecíveis — e, no pior, de gosto duvidoso.

Para surpresa geral, a Marvel Studios e o diretor Matt Shakman — conhecido por “WandaVision”, uma das raras séries bem-sucedidas do Disney+ — entregam um filme que vai além do funcional. Quando comparado à média das produções recentes da empresa, o resultado é não apenas positivo, mas em alguns momentos, surpreendentemente acima das expectativas.

Excelsior!

A jornada se desenrola na Terra-282 — uma homenagem à data de nascimento de Jack Kirby, o quadrinista que, ao lado de Stan Lee, deu vida ao Quarteto nas páginas da Marvel Comics nos anos 1960. A trama, na ocasião, é apresentada com agilidade: em poucos minutos, descobrimos que o grupo atua como equipe de heróis há quatro anos e que Reed Richards e Sue Storm estão à espera de um filho. A paz é abruptamente rompida com a chegada da Surfista Prateada, que pousa em Nova York para anunciar a aproximação de Galactus — uma entidade cósmica de origem misteriosa, determinada a consumir a Terra. O conflito ganha força quando o vilão, colossal na tela IMAX, revela sua exigência: poupará o planeta se receber, em troca, o filho do casal.

A partir desse ponto, o filme adota um tom inesperado dentro do gênero. Em vez de seguir o caminho convencional da ação ininterrupta, a narrativa se aproxima da ficção científica clássica, evocando o espírito das primeiras temporadas de Jornada nas Estrelas, de Gene Roddenberry. O foco se desloca para o planejamento estratégico, os dilemas morais e a tensão crescente, deixando em segundo plano as batalhas físicas e o uso excessivo de superpoderes. Felizmente, a proposta funciona graças à sintonia do elenco, que sustenta as relações e impulsiona o ritmo da história.

Mesmo personagens com pouco tempo de desenvolvimento se revelam fundamentais — como o jornalista que apresenta o grupo ao público, a professora por quem Ben Grimm nutre uma paixão platônica ou a própria cidade de Nova York, que acolhe os heróis quando se sente protegida, mas os repudia ao se sentir abandonada. É um filme que, queira ou não, carrega uma carga política forte o suficiente para conferir aos personagens motivações reais, atos de desespero e gestos de empatia diante da iminência da morte. É revigorante assistir esse arco ganhando vida.

Consequentemente, o longa consegue, mesmo dentro das limitações inerentes a uma adaptação de quadrinhos, construir uma identidade própria. A direção conduz com precisão o aumento gradual do desespero dos personagens, que precisam improvisar soluções diante da ameaça iminente — em uma estrutura que remete aos melhores episódios da já mencionada série original de Star Trek.

Nesse cenário, a trilha sonora de Michael Giacchino se destaca como um dos grandes acertos do filme. Com vasta experiência em obras de ficção científica — incluindo os Star Trek dirigidos por J.J. Abrams —, Giacchino entrega uma composição que reforça o clima da narrativa sem nunca soar invasiva. Um exemplo marcante é a sequência ambientada em um buraco negro, onde a música intensifica a tensão enquanto os personagens enfrentam, em paralelo, uma série de crises simultâneas.

Entre as atuações, Vanessa Kirby merece destaque especial. Sua Sue Storm é a versão mais cativante da personagem já vista até hoje, em qualquer mídia. Carismática, segura e dotada de grande presença dramática, Kirby eleva a heroína da condição de coadjuvante romântica para protagonista ativa da trama. Sue surge como a força motriz do grupo, não por genialidade técnica, mas por uma motivação poderosa e visceral: a maternidade.

Seus discursos, conflitos internos e decisões nascem dessa condição — e a atriz sustenta essa transformação com naturalidade. A sequência final, por exemplo, em que ela enfrenta Galactus, é um dos momentos mais impactantes do filme, evocando o mesmo peso dramático do confronto contra Thanos em Guerra Infinita. Antes disso, o discurso em que ela reflete sobre como a sociedade deveria agir diante do abismo figura facilmente entre os melhores momentos não apenas da franquia Marvel, mas de todo o gênero de super-heróis. Em meio a produções desgastadas, é especialmente significativo assistir a uma personagem que nunca recebeu o devido valor nas telas conquistar a força para se tornar maior do que qualquer devorador de planetas.

Por fim, é reconfortante imaginar que Jack Kirby — homenageado não apenas visualmente, mas também no âmago da obra, que se inspira genuinamente em seus momentos mais memoráveis nas páginas das HQs — teria motivos para se orgulhar. Nesta versão, há uma sincera tentativa de respeitar os personagens, que carregam consigo muito do legado do autor. E, ao contrário de outras adaptações, desta vez eles parecem realmente ganhar vida.

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