
É empolgante testemunhar A Garota Canhota marcar a estreia solo de Shih-Ching Tsou na direção. Colaboradora de longa data de Sean Baker, com quem produziu Projeto Flórida e Red Rocket, além de co-dirigir Take Out, Tsou demonstra aqui uma segurança admirável.
Aplaudido em Cannes e na 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o filme traz ecos do estilo de Baker, mas revela uma autora com olhar próprio, capaz de equilibrar sensibilidade e humor com frescor.
Não por coincidência, Baker, vencedor do Oscar por Anora, assina a produção, o roteiro e a montagem do longa. Sua presença é perceptível, mas o filme pertence inteiramente a Tsou.

A diretora absorve a leveza e a ironia típicas de seu colaborador, mas as transforma em algo mais íntimo e observacional, centrado na relação entre mulheres que tentam resistir às frustrações cotidianas.
A trama acompanha uma mãe que retorna a Taipei, enquanto sua filha mais velha aceita um emprego abaixo das expectativas da família.
Diante das dificuldades, a mulher e a filha mais nova passam as noites vendendo ramen em um mercado noturno, numa tentativa de reconstruir o sustento e, talvez, o afeto que as une.
Tsou observa essa rotina sem pressa, deixando que o humor surja naturalmente em gestos, olhares e pequenos desencontros.
Consequentemente, o roteiro flui com naturalidade e alcança um equilíbrio raro entre comédia e melancolia. Mesmo quando o drama perde força na reta final, o filme continua envolvente, sustentado por um elenco que parece simplesmente viver diante da câmera, sem precisar de disfarces. Essa espontaneidade torna fácil a identificação com as personagens.
Visualmente, o contraste entre espaços reforça esse olhar sensível. Taipei surge como um organismo vivo, vibrante e caótico, enquanto o interior do apartamento da família é dominado por sombras e silêncios.
Entre esses dois mundos, o da sobrevivência e o do cansaço, as três gerações improvisam para manter um mínimo de dignidade, cercadas pela promessa de um futuro que nunca chega.
No fim, A Garota Canhota é uma pequena joia: um retrato delicado sobre abandono e precariedade afetiva que também funciona como comédia de erros e estudo de personagens. Shih-Ching Tsou estreia com uma obra segura, divertida e comovente.
Pouco prometeu, muito entregou.
Filme visto na cobertura da 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo












