
Noite chuvosa, cidade desconhecida, bairro deserto. Você chega para se hospedar em uma casa que reservou no Airbnb e, já na porta, descobre que há outra pessoa ocupando o local. Você tenta ligar para o anfitrião, sem sucesso. Os hotéis da cidade estão lotados por conta de um evento. O outro hóspede sugere que vocês compartilhem a casa e resolvam a situação no dia seguinte. Você aceitaria?
A premissa tensa e original do diretor Zach Cregger não descreve nem 1% dos horrores que envolvem ‘Noites Brutais’ (Barbarian, 2022). É o tipo de filme cuja experiência de assistir fica melhor se você souber o mínimo possível a respeito do enredo. Dito isso: esse texto traz alguns spoilers.
O longa aborda experiências assustadoras da vivência humana oscilando entre extremos, e o foco do suspense — e, mais tarde, do terror — se desloca a cada nova situação. Somos levados do desconforto entre Tess (interpretada por Georgina Campbell) e Keith (vivido por Bill Skarsgård) até o choque total quando nos deparamos pela primeira vez com a criatura agressiva que vive debaixo do porão.

Vale lembrar que a criatura em questão não é o elemento mais assustador de ‘Noites Brutais’. A Mãe, como é chamada a personagem de Matthew Patrick Davis, sobreviveu a violências ainda mais terríveis até assumir seu aspecto monstruoso. O verdadeiro monstro, porém, está nas profundezas do subsolo da casa, adoecido e debilitado.
Ao longo do filme, a protagonista Tess se vê confrontada pelo medo em uma variedade de instâncias: a possibilidade de ter que dormir no próprio carro na rua de um bairro estranho; dividir uma casa com um desconhecido; ser perseguida por um homem na calçada; descer até um túnel que já foi cena de crime; e tantas outras coisas piores. E em quase todas as vezes, seu instinto de sobrevivência falha terrivelmente.
A personagem vai contra a lógica e o bom senso para tentar ajudar pessoas que mal conhece, o que pode trazer muita frustração para o espectador. Alguns comentários online são bem diretos: “meu Deus, como pode ser tão burra?”. Aqui admito que não posso criticar os rumos do roteiro para a protagonista, já que consegui me imaginar seguindo alguns dos mesmos passos. Intencionalmente ou não, porém, sua empatia “excessiva” é recompensada nos minutos finais, em que Tess prevalece como a única sobrevivente. E convenhamos, se todo personagem fizesse boas escolhas, não existiriam filmes de terror.
O enredo inovador e a mudança de perspectivas na narrativa conferem ao filme um dinamismo raro em obras desse gênero, ainda que se equilibre no exagero em muitos momentos — beirando a teatralidade. É seguro dizer que ‘Noites Brutais’ andou para que ‘A Hora do Mal’ (Weapons, 2025) pudesse correr.