
A tradição de registrar momentos geralmente é influenciada pelas nossas famílias, principalmente pelo hábito de revelar, guardar e compor vários álbuns com os instantes suspensos em cada clique. Esses, sim, são retratos que o tempo não apaga.
A fotografia tem o encanto de arrancar histórias, lágrimas e saudades da minha avó. Nesse caso, o simples ato de sentar e revirar os álbuns faz com que as lembranças se tornem abrigos para ela, revelando rostos, imóveis e vozes, agora distantes, mas que resistem na memória como espécies de mapas sensíveis.
O valor dos fragmentos de luz é composto pela permanência, apesar das transformações ao longo do tempo. Os lugares mudam, as pessoas mudam, mas as imagens permanecem, sejam desgastadas, antigas, empoeiradas ou recentes, elas ainda permanecem.

O que eu quero dizer é que reaprendemos a sentir quando nos relacionamos com o audiovisual, por meio de fitas antigas, álbuns de família e arquivos armazenados no cartão de memória de algum aparelho eletrônico.
Ao reconhecer a beleza nas camadas do cotidiano, a cultura ganha um brilho maior daquilo que não se explica. Aliás, não haveria graça nenhuma se tentássemos elaborar alguma racionalidade para as experiências e sensações vividas ao assistir a um filme ou ao olhar uma fotografia esquecida no fundo da gaveta.
Acredito que somos formados e feitos por todos os filmes e imagens vistos ao longo da nossa trajetória. Esses objetos sensíveis compõem uma sociedade viva culturalmente, que celebra o passado, o presente e o futuro, ou seja, o que fomos, o que somos e o que ainda podemos nos tornar, com o entrelaçar das luzes e o plano de câmera.
As representações importam para que as lembranças do mundo sejam transmitidas e compartilhadas com os outros. Assim, uma rede de apoio é criada, onde os vestígios de afeto residem.
Às vezes, guardamos fotos de pessoas que não estão mais nas nossas vidas, ou de quem nem lembramos mais, mas, apesar disso, escolhemos mantê-las pela afetividade da memória. Como já foi dito por Zeniba, a vovó de Chihiro, no filme A Viagem de Chihiro:
“Nada do que acontece é esquecido, mesmo que você não se lembre.”
Tudo o que vivemos deixa marcas, ainda que invisíveis. As lembranças moram nos sonhos fragmentados, podendo ser memórias conscientes, aquelas que conseguimos acessar facilmente, como o que fizemos hoje de manhã, ou memórias inconscientes, aquelas que estão esquecidas, mas que ainda influenciam sentimentos e escolhas.