
Qual foi o primeiro filme de terror que você assistiu?
Começo perguntando porque, para mim, a memória é clara. No alto dos meus – talvez – 11 anos de idade, encolhida num canto de um quarto com outras quatro meninas, vi “O Chamado 2” se desenrolar na tela da TV. Porque começamos pela sequência eu jamais vou entender. Também não entendia o pavor que a mera possibilidade de o telefone fixo tocar, com uma voz sinistra do outro lado, me causava. Mas sabia que estava com medo.
Curioso demais, o medo. O filme acabou, a TV desligou e a tensão deu lugar às risadinhas de nervoso da pré-adolescência. Mas o medo continuava, lá no fundo dos pensamentos.

Se você é fã de filmes de terror, com certeza já ouviu: “mas quem é que ia querer sentir medo ou levar susto por diversão?”. Essa eu nunca consegui responder. Talvez porque seja difícil enxergar o terror somente como isso. O medo pode ser a trama principal, mas não faz a peça inteira – para tecer um “todo”, o terror pode usar o suspense, o romance, a comédia e o drama como fios.
Quando nos deparamos com bons exemplares do gênero, dá pra sentir um pouco de tudo. A dor de uma mãe desesperada em ‘O Exorcista (1973)’; a intensidade de uma paixão secular em ‘Drácula de Bram Stoker (1992)’; a dúvida provocada por um mistério sombrio em ‘A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça (1999)’; e por aí vai.
É frustrante lembrar o quanto o terror foi associado – quase exclusivamente, por um tempo – à categoria de filmes B, tendo em vista o quão rico o gênero se tornou desde seu princípio. Aqui, precisamos falar de história. Os primeiros elementos do terror no cinema foram trazidos pelo cineasta e ilusionista francês, Georges Méliès, em ‘O Solar do Diabo (1896)’. Com seus dois minutos de duração, o curta-metragem incorpora a pantomima, favorecendo gestos ao invés de palavras.
Foi um pouco mais tarde que o gênero começou a encontrar sua forma, guiado pelo movimento expressionista alemão no cinema. A obra em questão é ‘O Gabinete do Dr. Caligari (1920)’, dirigido por Robert Wiene. Nele, vemos o personagem Francis narrando sua experiência com o hipnotizador Dr. Caligari e o sonâmbulo Cesare, que podem estar por trás dos assassinatos em uma pequena cidade. O filme mostra uma arquitetura distorcida, iluminação dramática, sombras e maquiagem exagerada.
Vale contextualizar que o expressionismo alemão nasceu de uma insatisfação generalizada que tomou o país depois da Primeira Guerra Mundial, no meio da desilusão política e da grave crise econômica. Motivos de sobra para uma crise existencial da população, que se traduziu em arte – outras obras do período incluem ‘O golem (1920), ‘Nosferatu (1922)’ e ‘Metrópolis (1927)’. Décadas depois, a influência do movimento ainda se fez notar em clássicos como ‘Cidadão Kane (1941)’, ‘Um corpo que cai (1958)’ e até mesmo ‘Edward Mãos de Tesoura (1990)’.
Não posso falar por todos os fãs de terror, mas acredito que é pela curiosidade que nos inclinamos ao medo, mesmo quando o primeiro impulso é fugir, ou desligar a TV. É pela curiosidade que conseguimos aprender, entender outros pontos de vista, outros sentimentos. Se você olhar com atenção, vai ver que existe um tanto mais que só sustos em filmes de terror. Há muita experiência boa do outro lado, e é possível, sim, achar uma luz em meio à escuridão.