
O cinema de Wes Anderson nos últimos anos tem sido bastante interessante — desde Asteroid City, em que ele desmonta sua própria estética e narrativa em um processo de crise de identidade pós-pandemia, até os curtas lançados diretamente em streaming, como Henry Sugar, nos quais trabalha com extrema concisão ao adaptar contos de Roald Dahl. Agora, seu novo longa surge como uma reconciliação com o pop.
Em O Esquema Fenício, um dos homens mais ricos da Europa faz de tudo para proteger seu empreendimento mais extravagante. O excêntrico magnata Zsa-Zsa Korda (Benicio del Toro), que já sobreviveu a seis acidentes de avião e é pai de nove filhos homens e uma única menina — a freira Liesl (Mia Threapleton) —, decide que ela será sua única herdeira. Antes, porém, pede sua ajuda para concretizar seu projeto de vida. Juntos, eles embarcam em uma jornada pelo mundo ao lado do ingênuo tutor Bjorn (Michael Cera), negociando com empresários, empreiteiros e criminosos perigosos, confundindo-os sobre suas verdadeiras intenções para afastá-los da trama.
Anderson percebeu que sua estética havia se tornado uma grife — especialmente após internautas usarem inteligência artificial para recriar grandes franquias em seu estilo visual. Isso evidenciou o esvaziamento de sua narrativa original. Diante desse desgaste, a saída foi a desconstrução. Henry Sugar encarna essa virada de forma brilhante: em um verdadeiro surto criativo, o diretor passa a abordar temas políticos e sociais dentro de uma estrutura que beira a paródia de sua própria estética.

É como se, de maneira metalinguística, ele esvaziasse esse estilo e recuperasse o que tentaram tirar de suas mãos — ou reduzir a meros traços como simetria, cores pastel e aspect ratios incomuns.
Agora, em O Esquema Fenício, o diretor parece em paz com isso. Aqui, ele mergulha em uma espécie de autofagia, recorrendo a referências de seu próprio universo para criar uma aventura repleta de ação e um road movie com nuances de espionagem.
Anderson demonstra interesse em retomar, por exemplo, temas de O Grande Hotel Budapeste — não apenas narrativos, mas até mesmo cenas de perseguição semelhantes. No entanto, abandona a estrutura em capítulos, como um livro, e adota a lógica de objetivos de um jogo, com um caderno de missões e negociações.
Situações absurdas se desenrolam, e o humor deadpan, já característico do diretor, funciona muito bem — assim como as atuações de Benicio del Toro e Michael Cera, que se entregam completamente aos personagens. Anderson parece se divertir nessa brincadeira autofágica, misturando julgamento terreno e até divino em sua narrativa, transformando tudo em uma possibilidade fértil para o filme mais despretensioso do autor nesses anos recentes de surto criativo e autoimportância.