
O surgimento do jazz se deu no seio da classe trabalhadora e afro-americana no final do século XIX, nos Estados Unidos, especialmente em Nova Orleans. Enquanto gênero musical, trouxe pilares da cultura musical africana, especialmente os spirituals, cantos de trabalho nas lavouras durante o período escravocrata, o ragtime, caracterizado pelo ritmo sincopado, onde a melodia é tocada de forma a enfatizar os tempos fracos do compasso, criando um efeito de contratempo, o blues, também com sua sonoridade, e as marchas europeias, pela harmonia e instrumentos. O jazz tem sua origem e desenvolvimento atrelados à luta pelo combate às opressões, tendo imensa relevância nos movimentos sociais pelos direitos civis da população negra estadunidense. Desde suas primeiras experimentações, o jazz se coloca como uma força espontânea e imensamente criativa, já que tem como um dos pilares principais de sua estrutura a improvisação.
O Swing e o Bebop
Os primeiros estilos a se formarem no movimento musical do jazz foram o Swing, a partir da década de 30, caracterizado pelo ritmo pulsante e fluido. Ritmo que lotava os salões de dança, e tinha como principal objetivo o entretenimento. Alguns dos artistas que marcaram o período do Swing foram Duke Ellington, Ella Fitzgerald e Frank Sinatra. O Bebop Jazz surge a partir de 1940, como reação ao swing comercial. Sendo um ritmo menos dançante, é para se ouvir com muita atenção. Apresenta também uma maior complexidade no sentido técnico, com linhas melódicas difíceis, tempos acelerados, com rápidos acordes e improvisações. Em contraposição ao primeiro estilo, representado por artistas que acompanhavam grandes bandas orquestrais, o bebop é tocado por grupos menores, focando nos solos e na expressão individual de cada artista e instrumento. Para sentir o Bebop Jazz é imprescindível Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Thelonious Monk, Mary Lou Williams, dentre outros grandes nomes que deram o primeiro grande chacoalhar no jazz.

Hard bop e cool jazz
O Hard Bop, surgido entre 1950 e 1960, foi uma transformação a partir do bebop, e foi bastante influenciado pelo blues, gospel e R&B. Apesar de também apresentar complexidade técnica, traz mais sentimento e groove. Outra importante característica do hard bop é a presença enfática da bateria, com batidas mais fortes. Alguns pioneiros foram Art Blakey, Horace Silver, Miles Davis (em fases) e Clifford Brown. O cool jazz surge em diferenciação ao bebop e hard bebop, apresentando assim um ritmo mais lento e controlado, tornando a música mais suave e relaxada, refletindo o estilo de vida e aspectos culturais de seu lugar de surgimento, a Califórnia. Alguns expoentes do cool jazz foram Miles Davis (em seu álbum Birth of the Cool), Gerry Mulligan e Dave Brubeck.
Modal jazz
Caracterizado por uma forte modulação e poucas mudanças de acorde, em contraposição aos outros estilos de jazz, em que há uma mudança mais rápida de acordes, principalmente no bebop e hard bop. No modal jazz, eles ficam por muito tempo no mesmo modo, o que dá liberdade para explorar melodia e improvisação de forma mais profunda. Teve como pioneiros Miles Davis, com o álbum Kind of Blue (1959) e John Coltrane, com My Favorite Things (1961) e Impressions (1963).
Jazz fusion e Jazz contemporâneo
No final da década de 60, absurdamente influenciado pelo contexto de efervescência cultural revolucionária da época, o jazz fusion surge mesclando elementos clássicos do jazz, como a improvisação e complexidade harmônica, com o rock, funk, R&B e música eletrônica. Sendo então, um estilo mais elétrico, energético, e muito marcado pela experimentação. Além da mistura de elementos de diversos gêneros musicais, outra importante transformação movimentada pelo fusion são os instrumentos elétricos, como a guitarra e sintetizadores, e a versão elétrica de instrumentos característicos do jazz, como do piano, que se torna o teclado, e do contra baixo acústico, que dá lugar às experimentações do baixo elétrico. Os álbuns Bitches Brew (1969) de Miles Davis e Heavy Weather (1979) da banda Weather Report foram marcos dessa metamorfose do jazz. Atualmente, o jazz segue mesclando suas raízes com diversos gêneros musicais, e tendo a improvisação, expressividade e experimentação como norteadores. Artistas de jazz da modernidade seguem essa metamorfose criando combinações esplêndidas como A Tribe Called Quest, pioneiros do Jazz Rap, Nujabes, artista que mesclou lo-fi hip hop com jazz. Importante citar também nomes que revivem e ao mesmo tempo subvertem o jazz com sua arte na atualidade, como o percussionista Yussef Dayes, o saxofonista Kamasi Washington e a contrabaixista e cantora Esperanza Spalding.
O jazz, é, sobretudo, uma atividade contemplativa que nos potencializa, enriquece e embeleza a existência. É estado de fôlego e de mergulho profundo nas coisas ao redor. É a atenção plena, o ritmo desacelerado e o recolhimento. A vida no modo de produção capitalista é contraditória à vida contemplativa. Primeiramente, pela dominação do tempo da classe trabalhadora, e também (ou consequentemente), pela mudança radical na estrutura de nossa atenção. A necessidade imposta e introjetada pela multitarefa, pelo desempenho e a superprodução, nos leva ao empobrecimento da capacidade de contemplar.
Há semanas venho batalhando contra a enorme dificuldade de sustentar minha atenção, inclusive em atividades muito prazerosas para mim, como assistir filmes. Meu pensamento é tão acelerado quanto a vida moderna, quanto a rotina dos trabalhadores, quanto o nosso tempo. É extremamente desafiador uma atividade que nos peça para funcionar em completo oposto a isso. Mas esse desafio sempre tomei para mim, e permaneço na insistência em me dedicar ao ócio, à contemplação. Após tantos dias me esforçando para conseguir retomar minhas capacidades de atenção e contemplação, algo foi capaz de me tirar daquele caos frenético de pensamento. A música Like it is, do grandioso Yusef Lateef, foi capaz de transformar esse caos em contemplação. Não foi a primeira, nem a vigésima vez que escutei essa música, mas me impressiona muito que seu impacto sobre mim em nada diminuiu. A conexão com o jazz é mesmo transcendental, e qualquer um pode e deve vivenciá-la. Como pensou um certo filósofo sobre a nossa expansão e afirmação do ser: “viver cada instante com toda a intensidade é a vontade de potência no seu mais alto grau”.